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terça-feira, 14 de novembro de 2017
Quem Controla o Poder Judicário?
16:14
Laurence Yugo Uehara
1 comment
Uma análise do
processo de aprovação do orçamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
O poder judiciário é o terceiro braço do Estado, responsável pela
solução de conflitos da sociedade e por assegurar os direitos dos cidadãos.
Estas ações são garantidas pelos órgãos que compõem o poder judiciário –
estabelecidos através da Constituição Federal de 1988 -, sendo os de maior
importância o Supremo Tribunal Federal (STF), o Superior Tribunal de Justiça
(STJ), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Justiça do Trabalho e a Justiça
Militar.
Por conta dos recentes escândalos de corrupção e crise política que o
sistema político brasileiro viveu no último decênio, o STF acabou ocupando
quase todo o espaço da mídia e das comunicações em geral, chegando ao ponto do mesmo
representar simbolicamente o poder judiciário por completo. Dessa forma, todos
os órgãos além do STF acabaram por passar despercebido por grande parte da
população brasileira, principalmente na questão orçamentária, mesmo com todos
os dados de acesso à informação disponíveis para a população. Este é o caso do
Superior Tribunal de Justiça.
Criado com a Constituição Federal de 1988, o STJ é a corte responsável
por uniformizar a interpretação da lei federal em todo o Brasil. Também é de
responsabilidade do STJ julgar todas as matérias infraconstitucionais não
especializadas, ou seja, aquelas que não são ligadas à Justiça do Trabalho,
Militar e Eleitoral. Em sua composição, têm-se trinta e três ministros, todos
nomeados pelo Presidente da República, e de origem diversificada: um terço de
desembargadores federais, um terço de desembargadores de justiça, e um terço de
advogados e membros do Ministério Público. Atualmente, o STJ é presidido pela
ministra Laurita Vaz.
Assim como todos os outros órgãos do poder judiciário, o plano
orçamentário do Superior Tribunal de Justiça é elaborado por um comitê especial
formado por membros do próprio órgão. Para o ano de 2018 foi orçado uma quantia
de 1,4 bilhão de reais, sendo esta uma quantia relativamente baixa se comparada
a outros órgãos do poder judiciário, como a Justiça do Trabalho (R$20 bilhões)
e a Justiça Federal (11,4 bilhões). Porém, ao analisar a composição dos gastos,
nota-se que o STJ reserva cerca de dois terços de todo o orçamento para o
pagamento de pessoal (aposentadoria, pensionistas e vencimento de pessoal),
restando apenas um terço de toda quantia para os gastos anuais. Toda essa
discussão sobre a composição do orçamento do STJ dá pano pra manga para outro
artigo, mas vale a pena ressaltar mais uma vez que a elaboração do plano
orçamentário é feita pelos próprios membros do STJ.
Seguindo o processo de aprovação do orçamento, ao ser aprovada pela
corte especial do STJ, o plano orçamentário segue para o Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), para que este emita o seu parecer favorável ou não ao programa.
Mas antes do parecer, é necessário entender o que seria o Conselho Nacional de
Justiça e qual sua função neste processo.
O CNJ foi criado em 2005 e é uma instituição pública que visa
aperfeiçoar o trabalho do sistema judiciário brasileiro, principalmente no que
diz respeito ao controle e à transparência administrativa e processual. Todo
plano orçamentário de todos os órgãos do poder judiciário devem passar pela
análise do CNJ e ser aprovado pelo mesmo. O conselho é composto por 15
conselheiros indicados pelos próprios órgãos do poder judiciário, sendo nove
magistrados, dois membros do Ministério Público, dois advogados e dois cidadãos de notável saber
jurídico e reputação ilibada. Ou seja, é um conselho composto majoritariamente
por membros do próprio poder judiciário.
Dada a composição dos órgãos de formulação e análise do plano
orçamentário, é intuitivo deduzir o resultado do parecer do CNJ: O parecer é
sempre favorável. Daí, o plano orçamentário segue para o Ministério do Planejamento
para ser aprovado.
A grande questão que fica depois disso tudo é: Quem controla o poder
judiciário, se são eles mesmo que formulam e julgam o próprio orçamento? O
poder judiciário está presente desde o início até o fim do processo de
aprovação do plano orçamentário, assim como no planejamento da alocação dos
recursos recebidos. Todas estas informações estão disponíveis no portal
transparência do Superior Tribunal de Justiça e são abertos para a população
consultá-las, porém que poder teria ela para questionar uma máquina tão bem
estruturada como à judiciária?
segunda-feira, 13 de novembro de 2017
CHOQUE DE JUSTIÇA E GESTÃO DO JUDICIÁRIO
16:48
Laurence Yugo Uehara
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A ONG Human Rights Watch divulgou no início desse ano um
relatório sobre a situação dos direitos humano em presídios de 90 países, com
dados coletados em 2016. Nesse documento o Brasil apresenta condições
precárias, com população carcerária 67% acima do suportado pelo sistema. Como
reflexo dessas condições a crise penitenciaria estourou no norte do país, no
inicio de 2017, provocando 133 mortes de
detentos em território nacional em apenas
15 dias.
O projeto Choque de Justiça1 surgiu como uma
resposta a essa crise, ele tem como objetivo a reavaliação jurídica da situação
de pessoas inseridas no sistema prisional e como enfoque a resolução dos
processos de prisões provisórias. Segundo Ministério da Justiça 41% das pessoas
presas estão em condição provisória, ou seja, ainda não foram julgadas.
No dia 12 de janeiro de 2017, os presidentes dos Tribunais
de Justiça dos Estados se reuniram com a Ministra Carmen Lúcia - presidente do
CNJ, órgão que esta coordenando as ações do projeto - e comprometeram-se a
coletar dados sobre os presos e acelerar os julgamentos dos processos de
prisões provisórias. No entanto, além de
muitos TJs apresentarem dados inconsistentes e desorganizados, como afirma o
CNJ, também encaminharam planos com pouca clareza na definição das atividades e
do cronograma; a maioria apresentou atos normativos (regra com poder de
coerção) desconectados do objetivo da ação.
O resultado dos esforços apareceu após o primeiro
quadrimestre de 2017, com queda no número de presos, gerando assim uma quebra
na tendência ascendente, houve uma redução de 4 mil presos provisório. Dos
processos de prisão reanalisados foram absolvidos cerca de 21 mil pessoas, o
que corresponde a 24% do total reanalisado. Pode-se depreender pelo apresentado
no relatório do CNJ e nos frutos dos trabalhos do poder judiciário, que a proposta apresentada tratou-se também de
um choque de gestão passageiro e incipiente, uma vez que, mesmo com o proposito
parcialmente alcançado, ficou clara a dificuldade dos Tribunais de Justiça
definirem metas tangíveis e ligadas ao objetivo.
O ponto de partida para solucionar esse problema já foi
tomado; treze anos atrás não havia nem mesmo estatística nacional sobre
processos judiciais, orçamento dos tribunais ou quantidade de magistrados do
Poder Judiciário brasileiro, foi em 2004 que o STF divulgou o primeiro
Relatório Justiça em Números2, elaborado pelo CNJ. Já no relatório
de 2017, com ano base em 2016, é possível perceber uma tendência de aumento da
despesa total com o Poder Judiciário desde 2009. Apesar
do crescimento constante dessa despesa a série histórica de processos pendentes
tem aumentado continuamente nesse período, como ilustra o gráfico abaixo.
SÉRIE HISTÓRICA DE PENDENTES
Fonte: Relatório Justiça em Números (2017)
Há um esforço perceptível do Judiciário, através
do projeto Choque de Justiça e dos dados coletados no Relatório Justiça em
Números, em compreender os gargalos do sistema que fazem parte e tentar
soluciona-los, no entanto o aumento crescente das despesas em contraste com a
persistência do crescimento de pendentes, assim como a dificuldade dos TJs em
coordenar esforços para atingir ao objetivo do Choque de Justiça, demonstram
que para além de zelar do cumprimento da norma legal o Poder Judiciário precisa
também de gestão interna para proporcionar atendimento mais eficiente e eficaz
à população.
16:40
Laurence Yugo Uehara
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A Insuficiência de Defensorias Públicas no
Brasil
Segundo estudo do
Ministério da Justiça, as Defensorias Públicas de 15 estados brasileiros ainda abrangem
menos de 50% de suas comarcas.
Por Giuliano Artero
13/11/2017
Qualquer pessoa que tenha
necessidade pode conseguir atendimento jurídico gratuito, seja para obter
defesa ou dar início a um processo. Para isto, basta que ela comprove que não
tem condições de pagar as custas de um processo e os honorários de um advogado
sem que assim acabe prejudicando seu sustento próprio ou o de sua família.
O critério utilizado para selecionar
aqueles que podem (ou não) ter acesso a este serviço, majoritariamente, é o
valor da renda familiar do indivíduo. Para poder contar com o atendimento, a
pessoa não pode ter uma renda familiar líquida superior a 3 (três) salários
mínimos, o equivalente a aproximadamente R$ 2.811,00.
Também há a possibilidade de o
defensor público analisar casos específicos para atender pessoas que recebam
mais do que este valor, quando ficar demonstrada uma situação de
vulnerabilidade enfrentada pelo indivíduo, como por exemplo pela idade ou algum
tipo de incapacidade, ou para grupos específicos e minorias – como migrantes ou
imigrantes- ou então por pobreza, e gênero.
O meio pelo qual qualquer cidadão,
desde que enquadrado nos critérios acima, pode alcançar a orientação jurídica
desejada é a através de uma Defensoria Pública. Tal órgão foi criado especialmente
para assegurar o direito de acesso à justiça de forma integral e gratuita para
as pessoas consideradas necessitadas, interpretadas neste caso como aquelas
economicamente incapazes ou que se encontram em alguma situação de
vulnerabilidade. Este direito está
previsto no artigo 134 da Constituição Brasileira, e também deveria ser
garantido assim como o direito à saúde e à educação, por exemplo.
Contudo, o IV Diagnóstico da Defensoria Pública no
Brasil, um estudo produzido pelo Ministério da Justiça em parceria com o
CEJUS (Centro de Estudos sobre o Sistema de Justiça) publicado em 2015, nos
mostra que a cobertura da Defensoria Pública ainda é insuficiente e muitas
vezes inexistente em muitas localidades do nosso vasto país.
Em 2014,
o Brasil possuía 2.727 comarcas (circunscrições jurídicas territoriais), porém
em apenas 1088 delas havia ao menos um defensor público para atender à
respectiva população pertencente a comarca, o que representa uma taxa de
cobertura razoavelmente baixa de aproximadamente 40%.
Tendo em
vista que aqui tratamos das Defensorias Públicas estaduais, observaram-se também
diferenças entre os próprios estados da federação quanto ao número de comarcas
abrangidas por ao menos um defensor público. Os estados, que possuem as piores
taxas de cobertura são Goiás (2,3%), Bahia (10,1%), Rio Grande do Norte
(13,8%), Paraná (14,6%) e São Paulo (15,8%)².
Ao lado observamos
um mapa que destaca a proporção de comarcas atendidas pelas Defensorias de
cada estado em 2014.
Foi em meio a este cenário que em 2014
o Congresso Nacional aprovou a Emenda
Constitucional n°80, a qual prevê que “o número de defensores públicos na
unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda pelo serviço de
Defensoria Pública e à respectiva população”, e ainda que “no prazo de 8 (oito)
anos a União, os Estados e o Distrito Federal deverão
contar com defensores públicos em todas
as unidades jurisdicionais”.
Tal proposição,
apesar de ser claramente positiva para fortalecer e capilarizar a atuação das
defensorias estaduais, depende em grande parte do emprego de recursos (humanos,
físicos e financeiros) dos governos estaduais para que as metas possam ser
cumpridas. Logo, a expansão das Defensorias também passa necessariamente pelo
interesse e capacidade do poder público estadual em expandi-las.
Apesar de aprovada em 2014, o caminho
a ser percorrido pelos estados para a aplicação da meta estabelecida pela EC
n°80 é complexo, conforme podemos observar no gráfico que trata da abrangência
das comarcas pelas Defensorias estaduais.
A variação das abrangências por
comarcas pelas Defensorias Públicas estaduais entre 2003 e 2014 nos fornece um
panorama quanto às oscilações, tanto de expansão como de retração, permitindo
termos uma ideia do desafio a ser enfrentado para atender à meta da EC
n°80/2014.
Apesar de algumas variações positivas,
15 estados ainda possuem suas
defensorias abrangendo menos de 50% de suas comarcas. Ou seja, durante os 11 anos analisados pela pesquisa, mais da metade dos estados brasileiros,
incluindo também o Distrito Federal, não foram capazes de fornecer esse tipo de
serviço de assistência jurídica sequer à metade das comarcas pertencentes aos
seus territórios.
Mesmo considerando que as comarcas
variam quanto número de habitantes, de
eleitores, receita tributária, movimento forense e a extensão territorial dos
municípios do estado e logo podem atender números distintos de pessoas de
acordo com a magnitude de cada comarca, evidencia-se que ainda há um grande
número de pessoas que, mesmo não tendo sido estimado numericamente no estudo,
evidentemente não gozam se quer da possibilidade de buscar qualquer tipo de
assistência jurídica gratuita fornecida pelo Estado.
Ainda que seja explicitamente
garantida pela Constituição, a assistência não vem sendo integralmente garantida
aos cidadãos de direito, o que prejudica, novamente, os já mais prejudicados:
aqueles incapazes de usufruir dos sistemas de justiça por se encontrarem
vulneráveis, tanto social como economicamente.